COMUNIDADE CIENTÍFICA RECOMENDA A INCLUSÃO DE CIÊNCIA ABERTA NO PLANO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO

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COMUNIDADE CIENTÍFICA RECOMENDA A INCLUSÃO DE CIÊNCIA ABERTA NO PLANO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO

Por Mauro Leslie

Imagem criada por aplicativo de “inteligência” artificial para a Revista Poliética.

Em carta aberta, cientistas brasileiros recomendam a Ciência Aberta à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), manifestando sua preocupação pela falta de políticas públicas de Ciência Aberta no quadriênio 2024-2028 do Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG).

Protagonizada por um grupo de cientistas que incentivam as práticas de Ciência Aberta, a carta destaca que a Ciência Aberta é fundamental para um Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG) democrático, equitativo, inclusivo, transparente e voltado para as necessidades da população.

Destaca a carta aberta que o fortalecimento das ações nacionais para fomento de publicação em periódicos científicos de acesso aberto diamante, a cooperação e colaboração entre pesquisadores e cidadãos, o compartilhamento de dados científicos de pesquisa financiados com recurso público, o desenvolvimento de hardwares e softwares com códigos-fontes abertos, a manutenção de repositórios de dados e publicações, o multilinguismo, a bibliodiversidade, dentre outras ações, são práticas fundamentais que devem ser incentivadas e reconhecidas no âmbito do PNPG.

Segundo a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), esta recomendação delineia uma definição comum, valores, princípios e padrões compartilhados para a Ciência Aberta em nível internacional e propõe um conjunto de ações conducentes a uma operacionalização justa e equitativa da Ciência Aberta em âmbito individual, institucional, nacional, regional e internacional.

Entenda o que é a Ciência Aberta

A ideia por trás da Ciência Aberta é permitir que as informações científicas, dados e resultados sejam mais amplamente acessíveis (acesso aberto) e aproveitados de forma mais confiável (dados abertos) com o envolvimento ativo de todas as partes interessadas (aberto à sociedade). Ao incentivar a ciência a estar mais conectada às necessidades da sociedade e ao promover oportunidades iguais para todos (cientistas, formuladores de políticas e cidadãos), a Ciência Aberta pode ser uma verdadeira virada de jogo ao preencher as lacunas de ciência, tecnologia e inovação entre e dentro dos países e preencher o direito humano à ciência (UNESCO, 2021).

A Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, (UNESCO), reunida em Paris (2021), em sua 41ª sessão, recomenda a Ciência Aberta.

Aplicações da Ciência Aberta

A Ciência Aberta é a ação científica praticada de modo livre, colaborativo e transparente, em todos os domínios do conhecimento, escreve Viviane Solano em matéria no site da Embrapa “O que é a Ciência Aberta” e diz mais, a Ciência Aberta é a atividade científica praticada de modo aberto, colaborativo e transparente, em todos os domínios do conhecimento, desde as ciências fundamentais até às ciências sociais e humanidades. A Ciência Aberta é mais do que o acesso aberto às publicações e dados de pesquisa. A Ciência Aberta implica que o processo de pesquisa seja ele próprio aberto, usando métodos, ferramentas e workflows que facilitem a partilha, reutilização e colaboração. Por isso, a Ciência Aberta é um conceito abrangente que se baseia em diversos pilares e inclui múltiplas dimensões: Acesso aberto, dados abertos, ciência cidadã, revisão por pares aberta, código aberto, caderno aberto de laboratório, recursos educacionais abertos, redes sociais científicas. A partilha dos resultados e dos métodos de pesquisa potencializa o seu conhecimento e reutilização por outros. A sua pesquisa será mais visível, poderá ter maior impacto e isso facilitará o estabelecimento de novas parcerias e colaborações. Viviane Solano,  bibliotecária da Embrapa desde 2006, ainda elenca algumas aplicações da Ciência Aberta, como preservar, valorizar e partilhar a produção científica; promover o Acesso Aberto / FAIR (Findable, Accessible, Interoperable, and Reusable) aos dados e publicações científicas; proteger e valorizar a propriedade intelectual, transparência e o conhecimento do processo científico; envolvimento da sociedade no processo de (co)criação e fruição do conhecimento, democratizar o acesso ao conhecimento científico.

A carta demostra medidas para inserir a Ciência Aberta no Pano Nacional de Pós-Graduação, dentre eles a promoção da Ciência Aberta como estratégia para um ambiente de pesquisa que contemple os distintos processos de produção e compartilhamento do conhecimento; normativas de livre acesso às teses e dissertações em modo aberto; inclusão de indicadores com vistas às práticas de Ciência Aberta.

Segue a carta, na íntegra, elaborada pelo grupo de cientistas:

“Ao Conselho Técnico-Científico da Educação Superior (CTC-ES) – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)

A comunidade de pesquisadores brasileiros que praticam e/ou incentivam a ciência aberta vem, respeitosamente, por meio desta carta aberta, demonstrar sua preocupação com a ausência da valorização e indicação explícita das dimensões e práticas da ciência aberta no Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG 2024-2028), bem como nos instrumentos avaliativos da pós-graduação brasileira para o próximo quadriênio 2025-2028, apresentados para contribuições durante os Seminários de Meio Termo em 2023.

O PNPG (2024-2028) tem como missão “assegurar uma pós-graduação de qualidade, diversa, equitativa, inclusiva e conectada com as necessidades da sociedade” e está amparado nos valores da diversidade, equidade, inclusividade, qualidade, colaboração e transparência. Diante dessa missão e valores, pontuamos que não há como conseguir um

Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG) democrático, equitativo, inclusivo, transparente e voltado para as necessidades da população, sem incluir os elementos da Ciência Aberta no PNPG.

A ciência aberta é um movimento internacional de abertura e transparência da pesquisa científica e envolve diferentes atores, desde o cientista em formação até o cidadão comum que participa do processo de fazer ciência e/ou usufrui dos seus resultados. Esse movimento ganhou centralidade nas agendas das políticas científicas em âmbito mundial e tem sido incentivado por governos, agências de fomento, universidades, institutos de pesquisa e pela comunidade científica nacional e internacional como um todo, tendo em vista seus benefícios para a produção e difusão do conhecimento científico.”

A UNESCO publicou o documento “Recomendação da UNESCO sobre Ciência Aberta” em 2021 e chamou os países membros para a ação no que diz respeito à ciência aberta:

1) Adota a presente Recomendação sobre Ciência Aberta neste 23º dia de novembro de 2021;

2) Recomenda que os Estados-membros apliquem as disposições desta Recomendação adotando as medidas apropriadas, incluindo quaisquer medidas legislativas ou de outra natureza que sejam necessárias, em linha com a prática constitucional e as estruturas governamentais de cada Estado, para dar efeito, em suas jurisdições, aos princípios desta Recomendação;

3) Recomenda também que os Estados-membros levem esta Recomendação ao conhecimento das autoridades e dos órgãos responsáveis pela ciência, tecnologia e inovação, e consultem os atores pertinentes envolvidos com a ciência aberta;

4) Recomenda ainda que os Estados-membros colaborem em iniciativas bilaterais, regionais, multilaterais e globais para o avanço da Ciência Aberta;

5) Recomenda que os Estados-membros informem, nas datas e das maneiras determinadas, sobre as medidas adotadas em conformidade com esta Recomendação (UNESCO, 2022).

Como é de conhecimento da CAPES, o governo e a comunidade científica brasileira já têm desenvolvido ações importantes em direção à promoção da abertura e da transparência na ciência. Um exemplo recente foi o desenvolvimento do Compromissos 8 – Construir uma proposta de modelo de avaliação que fomente a Ciência Aberta no 5º Plano de Ação Nacional em Governo Aberto. O 6º Plano de Ação Nacional em Governo Aberto que foi discutido em 2023 tem como Tema 3: Transparência, participação e colaboração na pesquisa e produção científica e contempla a Ciência Aberta de forma direta.

A comunidade científica brasileira e, em especial, as pesquisadoras e os pesquisadores que estudam os temas comunicação científica e Ciência Aberta demonstram, por meio desta carta, a sua preocupação pela ausência das dimensões da ciência aberta nos eixos e diretrizes do PNPG (2024-2028). Entendemos que o fortalecimento das ações nacionais para fomento de publicação em periódicos científicos de acesso aberto diamante, a cooperação e colaboração entre pesquisadores e cidadãos, o compartilhamento de dados científicos de pesquisa financiados com recurso público, o desenvolvimento de hardwares e softwares com códigos-fontes abertos, a manutenção de repositórios de dados e publicações, o multilinguismo, a bibliodiversidade, dentre outras ações, são práticas fundamentais que devem ser incentivadas e reconhecidas no âmbito do PNPG.

Nesse contexto, é necessário discutirmos e implementarmos ações e uma efetiva política científica nacional que trate de temas relacionados ao pagamento de taxas de publicação, ao fortalecimento e financiamento do ecossistema público de comunicação científica (que envolve os periódicos científicos nacionais), ao desenvolvimento de serviços e infraestruturas nacionais de ciência aberta, como repositórios de dados, bases de dados e indicadores regionais. Os fundamentos da Ciência Aberta permeiam vários aspectos do PNPG e, portanto, sugerimos:

a) considerar para “Estratégia 2.1.3 – Aperfeiçoar o processo avaliativo, da coleta ao tratamento e à análise dos dados, no sentido da simplificação e automatização de procedimentos” do Eixo 2 – Qualidade da pós-graduação e do SNPG, a inclusão de outros indicadores, entre eles, aqueles que permitem apreciar e valorizar as práticas de ciência aberta. Entretanto, alertamos que a avaliação não deve se limitar a análises quantitativas;

b) incluir a promoção da Ciência Aberta como uma das estratégias do “Objetivo 4.1 – Promover um ambiente de pesquisa que contemple os distintos processos de produção e compartilhamento do conhecimento no contexto do desenvolvimento sustentável” do Eixo 4 – Pesquisa, extensão e inovação;

c) adicionar ao item “Desafios a serem superados”, o acesso à informação científica e tecnológica por meio de ações de incentivo à Ciência Aberta como a valorização das publicações em acesso aberto diamante para diminuir as desigualdades regionais entre os programas de pós-graduação, bem como o desenvolvimento de uma política nacional de Ciência Aberta que envolva todas as suas dimensões;

d) considerar ainda o estabelecimento de normativa para disponibilizar as teses e dissertações em acesso aberto.

Os valores, diversidade, equidade, inclusividade, qualidade, colaboração e transparência, apresentados no PNPG, também são valores importantes e princípios orientadores para a ciência aberta e, portanto, reforçamos que é fundamental incluir abordagens e práticas de ciência aberta no plano. Reforçamos que a Ciência Aberta permeia todos os eixos apresentados no plano e pode ser explicitada por meio de estratégias bem definidas e colocamo-nos à disposição para auxiliar nessas discussões, pois também entendemos que é urgente a formulação de uma política nacional de Ciência Aberta a partir de um amplo e estreito diálogo com a sociedade.”

Referências

AGÊNCIA DE BIBLIOTECAS E COLEÇÕES DIGITAIS DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. UNESCO publica recomendações sobre Ciência Aberta. Disponível em: https://www.abcd.usp.br/noticias/unesco-publica-recomendacoes-sobre-ciencia-aberta/. Acesso em: 1 mar. 2024.

EMBRAPA. O que é Ciência Aberta? Disponível em: https://www.embrapa.br/agrossilvipastoril/sitio-tecnologico/seb-anterior/seb-em-acao-janeiro. Acesso em: 1 mar. 2024.

UNESCO. Draft text of the UNESCO Recommendation on Open Science. In: Intergovernmental Meeting of Experts (Category II), online, 2021. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000376893 Acesso em: 1 mar. 2024.

UNESCO. Recomendação da UNESCO sobre Ciência Aberta. Paris: UNESCO, 2022. Disponível em:  https://doi.org/10.54677/XFFX3334 Acesso em: 1 mar. 2024.

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